Santa Catarina está importando metade do milho que consome. O Estado nunca foi autossuficiente na produção, mas, com a alta do dólar, a exportação cresceu e a dependência do milho que vem de fora também. Na safra de 2015/2016, a perspectiva é que a produção atinja 2,9 milhões de toneladas. Porém, apenas em 2015, o consumo foi mais que o dobro: 5,9 milhões de toneladas. Esse montante terá que ser buscado no Centro-Oeste e até no exterior.
O cenário de crise em Santa Catarina é quase o mesmo de 2012, quando lideranças do agronegócio estadual pediram subsídio para o frete, leilões de milho da Conab no Estado e investimentos em infraestrutura. Naquele ano houve uma estiagem que frustrou a produção e elevou o preço do cereal.
– Já vimos essa cena e foi catastrófico para o Estado – disse o presidente da Federação da Agricultura do Estado de Santa Catarina, José Zeferino Pedrozo.
Ele lembra que empresas como a Bondio, Agrovêneto e Tramonto, acabaram sendo vendidas pois não tinham capital de giro suficiente para enfrentar a crise. Agora, além da alta na exportação, com menos milho no mercado, quem tem acaba não vendendo esperando ganhar mais.
– Tem milho no mercado, mas existe a especulação – lamentou o diretor-executivo do Sindicato das Indústrias de Carnes e Derivados de SC, Ricardo Gouvêa.
Somente de outubro a janeiro o Brasil vendeu mais de 20 milhões de toneladas de grão. Esse volume poderia abastecer Santa Catarina por quase quatro anos. Outro agravante é que a área plantada está se reduzindo a cada ano. O Estado tem apenas 1,2% que é plantado no país, mas em contrapartida é o maior produtor de suínos, o segundo maior de aves e o quinto em leite. Ou seja, tem muita demanda para uma oferta limitada.
Somente neste ano houve uma queda de 8% na área plantada. De acordo com o vice-presidente da Cooperalfa, Cládis Furnaletto, na região de abrangência da cooperativa a queda chegou a 25%. O motivo é que, no momento do plantio, o milho estava a R$ 22 ou R$ 23 a saca. Com aquele preço, mesmo o produtor tendo safra boa, de 150 sacas por hectare, não cobriria os custos, que eram de R$ 3,5 mil por hectare.
Os produtores comemoraram
Um dos que apostaram contra a corrente foi o agricultor Clademir Rigon. Ele aumentou de 2,5 para 5,5 hectares de milho, para fazer rotação de cultura. Nem ele imaginava que sua decisão seria tão acertada. Rigon deve colher 170 a 180 sacas por hectare. Com o milho a R$ 38, o resultado bruto é de R$ 6,5 mil. Vai sobrar R$ 3 mil por hectare para pagar a parcela de R$ 10 mil do trator que comprou recentemente e ainda ficar com uma reserva no banco. Se o produtor de grãos está feliz, não dá para dizer o mesmo dos suinocultores.
– O criador está perdendo R$ 50 por suíno – calculou o presidente da Associação Catarinense dos Criadores de Suínos, Losivânio Di Lorenzi.
Os independentes e mini-integradores, que representam 15% dos produtores com 400 mil matrizes, são os que mais sofrem com a escassez, pagando R$ 43, R$ 44 a saca. A entidade chegou a pedir ao governo do Estado isenção do ICMS para venda de suínos a outros Estados durante dois meses, o que reduziria o custo em 12% e aliviaria prejuízo.
Estado faz tentativas para amenizar a dependência
O Sindicarne/Associação Catarinense de Avicultura (Acav) também pediu medidas de subsídio ao frete do Centro-Oeste, o que não foi atendidoMas uma medida que realmente melhoraria a situação a médio e longo prazo seria a ferrovia. Segundo o presidente da Aurora Alimentos, Mário Lanznaster, anualmente cerca de 100 mil caminhões são necessários para buscar milho em outras regiões.
O secretário de Agricultura do Estado, Moacir Sopelsa, disse que estão sendo adotadas medidas para tentar amenizar a dependência de milho. Uma delas é o programa de subsídio dos juros para a construção de silos. Outro incentivo é o programa Terra Boa, que investiu R$ 44 milhões em subsídios de 220 mil sacas de semente e 310 mil toneladas de calcário.
O produtor Clademir Giordan, de Chapecó pegou cinco sacas de milho do programa e vai pagar com 20 sacas de produto para cada uma de semente. SC também dá crédito de 8,4% no ICMS para quem traz milho de fora. O secretário Moacir Sopelsa afirmou que o governo ainda está avaliando a possibilidade de redução do ICMS, embora afirme que neste momento não aumentar impostos já é um esforço.
Economista prevê queda no milho
A Doutora em Economia do Centro de Socieconomia e Planejamento Agrícola da Epagri, Gláucia de Almeida Padrão, prevê que o preço do milho deve cair a partir de agora. Um dos motivos é a safra catarinense, que já está mais de 15% colhida. Outro é a retomada da safra norte-americana. Um terceiro fator é a segunda safra do milho no Brasil, também chamada de safrinha. Essa oferta maior inibe a especulação e deve provocar uma retração no preço do cereal, mesmo que o dólar continue alto e incentivando as exportações.
“SC nunca foi e nunca será autossuficiente”
O aumento do preço do milho foi o principal responsável pela subida do custo de produção de suínos e aves. De acordo com estudo realizado pela Embrapa de Suínos e Aves, de Concórdia, somente em janeiro o custo do suíno aumentou 7,9% e, do frango, 6,2%. Em um ano o aumento é de 22,9% em aves e 21,9% em suínos. O analista de mercado Ari Jarbas Sandi falou sobre o cenário. Ele afirmou que o atual preço do milho é inviável para a criação de suínos e aves, mas prevê queda dos preços a partir de abril.
Por que o custo da agroindústria aumentou tanto?
Principalmente pelo milho, o principal componente da alimentação dos animais, que corresponde a 75% do custo de aves e suínos.
O que ocasionou esse preço elevado do milho?
O Brasil plantou menos esse grão, os estoques de passagem estão menores e não tem muito milho disponível num raio de 400 quilômetros. SC nunca foi e nunca será autossuficiente. E regiões de onde vinha o milho, como Paraná, Mato Grosso do Sul e Mato Grosso, plantaram mais soja. O preço deverá continuar alto até o final de março, início de abril, quando entra a safrinha.
Quanto custa para produzir suínos e aves?
O custo para produzir aves está de R$ 2,73 a R$ 2,79. Para um suíno, o ciclo completo de 110 quilos está de R$ 3,78. Em dezembro estava R$ 3,59. E a remuneração ao produtor está de R$ 2,90 a R$ 3. Hoje dá prejuízo, mas o suíno que está sendo vendido agora não comeu milho de R$ 45. Ele comeu milho de R$ 27, R$ 30, R$ 32.
Mas esses animais de agora em diante dão prejuízo, não é?
Se esse preço do suíno não aumentar para R$ 3,80 a R$ 3,90 até junho a coisa vai complicar. O preço do milho está um absurdo. Não creio que esse preço vai continuar até junho ou julho. Se acontecer quebra toda a cadeia. É insustentável.
Tem como amenizar isso com a exportação?
Nós só exportamos uma parcela da produção. Das 13 milhões de toneladas de frango produzidas, o Brasil exporta 3,6 milhões. Em suínos produzimos 3 milhões e exportamos 500 mil.
Vai sobrar para o consumidor esse aumento de custo?
Quem paga essa conta é o consumidor.
Vai ter aumento?
Vai. Só que ele terá que ser em menor quantidade. Porque com a inflação o poder de compra diminui. E se aumentar muito, diminui o consumo. Quem comia frango três vezes por semana, vai comer uma vez.
Que medidas poderiam ser tomadas?
O governo tomou algumas medidas como os leilões de milho a balcão, vendidos nas regiões consumidoras. As agroindústrias também poderiam fazer contratos de compra futura. Mas o que precisa mesmo é investir em infraestrutura ferroviária e silos de armazenagem. Não tem cabimento trazer milho do Mato Grosso em carreta.
Fonte: Diário Catarinense